agonia


Teve uma noite que fez tanto calor, mas tanto, que não teve ventilador que desse jeito, nem ar-condicionado que aquietasse minha agonia. E quem me conhece sabe que quando tiro pra ter agonia de uma coisa,  não consigo ficar parada vendo aquilo me consumir, sem ao menos reclamar uma vez sequer, mesmo que não dê jeito. Era madrugada, sei lá que horas, estava sozinha e não tinha ninguém ao lado pra dizer agoniadamente: vou morrer de calor. Morrer, com orgulho de quem esquece o que a mãe diz pra nunca dizer que vai morrer de algo, de fome, de sede, de preguiça. Mas de calor é justificável, acredito. Levantei, tirei o pijama como se fosse o motivo e me joguei na água gelada. Literalmente, me joguei, sem nem antes fazer uma horinha, colocar primeiro a mão, depois o braço, depois um ombro, num ritual sem sucesso no qual a água não vai ficar menos gelada, mas mesmo assim, faço toda vez. Naquela noite, eu me joguei com cabelo e tudo. Fechei os olhos e mentalizei uma piscina vertical. E lá fiquei. Não era hora de sabonete pro corpo, sabonete íntimo, sabonete pro rosto e toda esses trecos que mulher inventa de usar pra ficar, na realidade, com mais de seis cheiros diferentes pelo corpo no fim e ainda colocar um perfume. Agonia de tanto cheiro, também tenho. Meu banheiro tem uma multidão de coisas que se usados tudo ao mesmo tempo, eu morreria de agonia. E cheirosa, muito. Então não uso, e nem tenho tanta paciência de sair fragmentando meu corpo em dez partes pra dez coisas diferentes. 

Dei como terminado o banho, vesti o pijama e voltei pra cama. Poderia ter aumentado a velocidade do ventilador, mas faz muito barulho e meu cabelo fica voando, fazendo irritantes cócegas no meu rosto  Velocidade 1, sempre. Poderia ter ligado o ar-condicionado, diminuído a temperatura e esperar o clima de outono europeu tomar de conta. Poderia abrir a janela! Mas tenho um histórico grande de insetos e bichos que entram por ela sem aviso e me enlouquecem de susto. Não tenho problema em ficar em local aberto sujeita a arrastões de abelhas e borboletas. Embora, ficar no meu quarto, um lugar fechado, no qual quase sempre estou sozinha, com a janela aberta me deixa, pra não fugir do tema do texto, agoniada sem limites. O problema não era só o calor, eu estava impaciente, inquieta, querendo de verdade descer e ficar na borda da piscina, invejando o sono tranquilo do porteiro numa cadeira provavelmente desconfortável. 

Quantas vezes, estive pela faculdade, antes de alguma aula, em alguma mesa com metade no sol, de calça jeans até, sentindo calor, mas bem. Sem reclamar. Amarro o cabelo num coque sem lei bem alto e resolvido o problema. Mas naquela noite, não teve jeito. Na verdade, chegou uma hora que depois do banho, o calor passou e nem lembrava mais dele. Tentava dormir desenrolada, mas me sinto desprotegida, é isso. Enrolava só uma perna, deixava os braços de fora, colocava o cabelo pra cima, o travesseiro molhado e nada. 

Liguei a tv e fui direto pro cartoon, disney channel, boomerang e coisas do tipo. Não importasse o que estivesse passando, não seria algo muito difícil. Assisti padrinhos mágicos, bob esponja, até popeye e quando vi tinha esquecido de mim. Esquecido das minhas agonias, da minhas chatices e estava preocupada de como o popeye ia resolver os problemas com o brutus. 

Calor passou, o sonho veio e dormi com a tv ligada. 

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